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2018-10-01

Exercícios

“Sentar-se” é realmente o novo “fumar”?

Há muita gente afirmando que o comportamento sedentário representa um risco à saúde tão grande quanto o tabagismo. Se a ideia é incentivar a prática de atividade física “pelo susto”, pois bem, esperamos que funcione (sem muitas esperanças...). Contudo, a questão que se coloca é a seguinte: será que realmente temos evidências científicas suficientes que deem respaldo a associação de “fumar” com “permanecer sentado”? Para responder essa questão, convidamos a Ana Jéssica, doutoranda do Grupo de Fisiologia Aplica & Nutrição da USP e especialista neste tema. Aproveitem a leitura!


A população passa cada vez mais tempo (~9,6 horas/dia) em atividades sedentárias, ou seja, em atividades realizadas na posição sentada ou deitada com um baixo gasto energético. Nos últimos 10 anos, um grande número de estudos tem verificado os efeitos desse tipo de comportamento em desfechos de saúde. Entretanto, será as mensagens divulgadas para a população refletem o real achado desses estudos? Será que se sentar é igual a fumar? Dado o aumento na quantidade de notícias sobre comportamento sedentário e o “sensacionalismo” presente em muitas delas, está na "moda" artigos discutindo a validade das interpretações desses achados e divulgação dos mesmos.



A mensagem principal dos estudos dessa área é de que o comportamento sedentário seria um fator de risco isolado para a saúde, aumentando o risco de mortalidade por todas as causas e de desenvolver outras doenças crônicas. Nesse sentido, a atividade física moderada a vigorosa tem um papel importante de atenuar esse risco, principalmente nos indivíduos que mais praticam esse tipo de atividade. A ideia de que esse comportamento altamente prevalente no nosso dia-a-dia representa um risco para a saúde somado às propostas aparentemente simples para combater esse “mal” (por exemplo, levantar-se por 3 minutos a cada 30 minutos que passar sentado; descer do ônibus um ponto antes, etc.) chamam atenção dos cientistas e geram certa "empolgação". Entretanto, cabe cautela e sensatez na divulgação desses resultados.



Acaba de sair um comentário comparando os riscos associados ao comportamento sedentário com o hábito de fumar, tendo em vista a quantidade de notícias e recomendações fazendo tal comparação (sentar é o novo fumar!). Entretanto, quando comparamos os riscos de mortalidade por todas as causas desses dois hábitos, a diferença é gritante. Permanecer em comportamento sedentário excessivo representa um risco 0,2x maior de mortalidade (o que seria ~190 mortes/100000 pessoas), já o hábito de fumar representa um risco 2,7-4,4x maior de mortalidade (o que seria ~2000 mortes/100000 pessoas). O que conseguimos notar é que embora haja um risco associado ao comportamento sedentário, ele é muito pequeno, ainda mais quando comparado ao hábito de fumar. 



Aproveitando o assunto, ano passado saiu uma revisão comparando como as notícias sobre comportamento sedentário são divulgadas para a população na Austrália (um dos países lidera as publicações da área e, consequentemente, que mais chama atenção da população para isso) com os resultados dos estudos que estavam sendo divulgados. Já podemos imaginar os resultados, não é mesmo? A divulgação era distorcida, o comportamento sedentário era tido como um super vilão e a importância da prática de atividade física era minimizada. Nessa mesma linha, há uma revisão na revista British Journal of Sports Medicine discutindo se já é momento de haver recomendações para tempo sedentário. Para a nossa surpresa, apesar da pouca quantidade de evidências, já há 6 países com recomendações para redução do comportamento sedentário (mais uma consequência da “empolgação” dos cientistas com a área). As conclusões são como vocês devem imaginar, precisamos de cautela na interpretação dos resultados dos estudos da área e ainda não é o momento para tais recomendações. Para quem quiser mais informações sobre essas revisões, os artigos estão listados abaixo.



Comportamento sedentário prejudica a saúde? Talvez... Mas ainda não há suporte para incriminá-lo de vez e nem para o abolir dos nossos dias (e acho que ninguém quer isso). A área do comportamento sedentário ainda é muito recente e está em construção. Isso significa, em termos de produção científica, que muitos estudos são necessários para esclarecer esses pontos e solidificar essa área de estudo. Em termos práticos, ainda é muito cedo para haver recomendações. Em troca, o que é prudente, simples e pode ser incentivado com maior segurança é “Movimentar-se mais, independentemente da intensidade”! Então, respondendo à nossa pergunta inicial: Não, sentar-se não é o novo fumar.



Ana Jéssica Pinto



Doutoranda do Grupo de Fisiologia Aplica & Nutrição da USP



Para saber mais sobre o tema:




  • Ekelund et al. Does physical activity attenuate, or even eliminate, the detrimental association of sitting time with mortality? A harmonised meta-analysis of data from more than 1 million men and women. Lancet; 2016; 388: 24–30. 

  • Vallance et al. Evaluating the Evidence on Sitting, Smoking, and Health: Is Sitting Really the New Smoking? AJPH; 2018.

  • Chau et al. Sitting ducks face chronic disease: an analysis of newspaper coverage of sedentary behaviour as a health issue in Australia 2000-2012. Health Promot J Austr; 2017; 28:139–43.

  • Stamatakis et al. Is the time right for quantitative public health guidelines on sitting? A narrative review of sedentary behaviour research paradigms and findings. Br J Sports Med; 2018.







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